terça-feira, 29 de março de 2011

TODA MAMMA FAZ PAPPA


Aconteceu quase ao mesmo tempo. Uma amiga postou o link da reportagem sobre um morador de rua, ou melhor, um “morador de árvore” em plena avenida Radial Leste, na Bela Vista, no centro de SP. O jovem André Luis, de 23 anos, vive há cinco anos a seis metros do chão. Para sobreviver ele engraxa sapatos e cata latinhas, ganha uns trocados e faz seu miojo. André se sente seguro tendo como teto uma bela figueira-branca com dez metros de circunferência e garante que dorme tranqüilo apesar do tráfego intenso. O rapaz diz que tem o que precisa: uma TV que só não funciona porque ainda “falta puxar eletricidade”, um colchão, travesseiros, bichos de pelúcia, produtos de higiene pessoal e algum alimento... E muitas namoradas, contam os vizinhos que não se incomodam com sua presença entre as folhagens. André não reclama, mas sonha em viver em uma casa de verdade, no campo, claro! O cara é de uma leveza invejável! Bom, logo em seguida, uma amiga jovem e cheia de vida confessa, em uma rede social, ter “conseguido errar” o preparo do seu miojo. Fiquei atônita. Essa vida é mesmo um assombro! Dois jovens, dois mundos tão diversos, tão distantes em tudo... E todo mundo precisa de uma mãozinha, de ombro, de colo... O André precisa do básico pra ser verdadeiramente chamado de cidadão. Minha amiga, conhecimento primário de culinária pra sair do miojo ou pelo menos preparar um a contento. Tem gente que perde um pouco e se descabela; tem gente que ri porque não tem nada a perder. E assim caminha a humanidade (isso não é nome de filme?!)... Hoje vou fazer uma comida de mãe. Uma sopinha de tomates e pão amanhecido, deliciosa, nutritiva e baratinha, perfeita pra abrandar a dureza da vida. A pappa al pomodoro tem sua origem na região da Toscana, na Itália. Um dos primeiros alimentos sólidos oferecidos pelas mammas italianas aos seus bebês. Existem inúmeras versões dessa receita. Essa é bem simples. Doure 2 dentes de alho amassados e 1 cebola roxa picada em 100ml de azeite. Junte 6 tomates bem maduros picados sem pele e sem sementes. Abafe e cozinhe por 5 minutos em fogo brando. Acrescente uma lata de tomates pelados em cubos. Tempere com sal, pimenta, manjericão ou salsinha picados. Use punhados de miolo de pão italiano velho (ou o que tiver disponível). Abafe e deixe cozinhar por mais alguns minutos. Sirva assim ou salpique queijo parmesão. Buon appetito!

sexta-feira, 25 de março de 2011

GANA POR GANACHE


Ganache é um termo francês usado para designar uma pessoa desprovida de talento e inteligência; um incapaz; um estúpido. Como substantivo, ganache é a mandíbula do cavalo ou a parte protuberante do lábio inferior dos insetos, o queixo do bichinho. A ganache que nos interessa é uma mistura de partes mais ou menos iguais de chocolate e creme de leite fresco, muito utilizada como base de trufas. Uma delícia! A ganache é uma receita famosa que surgiu por volta de 1950 e como tudo nessa vida tem uma história, essa é a dela: um aprendiz chocolatier pega desajeitadamente o creme de leite fervido e o derrama involuntariamente sobre o chocolate. O mestre chocolatier entra em pânico diante do “desastre” e trata seu pupilo de “ganache”, o que era de se esperar, considerando a ira do mestre francês (eita povo nervoso!). Porém a mistura, antes de ser inutilizada, foi mexida, provada e surprise! Aprovada pelo mestre! O que se obteve foi uma massa lisa, brilhante e cremosa, perfeita. Batizado estava o bendito “erro” que longe de soar como um xingamento grosseiro traz em cada sílaba uma delicada sonoridade e enche a boca de prazer de quem as pronuncia com esmero. Hoje, o preparo é um clássico dos doces franceses e pode ter diferentes aromas que agradam qualquer paladar: pera, café, chá, framboesa são alguns exemplos. Já vi tantas maravilhas nascerem de “erros” que começo a temer meus acertos. Não vou mais trocar o certo pelo duvidoso, vou trocá-lo pelo errado mesmo! Gana, pra nós, é uma vontade (quase) incontrolável que sentimos em fazer algo, é garra, é desejo, é fome, é apetite, muito apetite... Beira ao insano, admito, mas pode ser tão bom! A Páscoa (no sentido comercial da data) está chegando e tudo é feito pra aumentar nossa gana, a gana por chocolate. Valha-me Deus, não sei do que sou capaz! Vamos fazer uma Ganache de chocolate ao maracujá? Providencie 250gr de chocolate meio-amargo ralado, 150ml de creme de leite fresco, 1 maracujá, 3 ou 4 colh. de sopa de açúcar, ½ copo de água. Derreta o chocolate em banho-maria, junte o creme de leite e misture bem. Coloque em taças bonitas e leve à geladeira. Derreta o açúcar até caramelizar, junte a água e a polpa do maracujá. Deixe ferver. Jogue a calda morna sobre a ganache só quando for servir. Bon appétit!

quarta-feira, 9 de março de 2011

A NEIDE ESTAVA, QUASE, CERTA



Feliz Natal é uma cidadezinha do interior de Mato Grosso. Conte umas seis horas de carro, saindo da capital, dando uma paradinha e outra, pra chegar até lá. Cidade simpática! Fui visitar um casal de amigos, os pais do Benício que nasceu há poucos dias. Uma benção! Quando chegamos, uma chuvinha fina regava e perfumava o final da tarde. E chuva, você sabe, abre o apetite. A especialidade do nosso anfitrião é uma espécie de “bifões de cordeiro” que ficam marinados em um molho verde, espesso e cheiroso antes de serem assados na churrasqueira da casa. Mas para a tal marinada misteriosa, faltavam algumas ervas e é aí que entra a Neide. A Neide é uma mulher bonita, sorridente, falante, cheia de vida e dona de uma horta de verdade, daquelas que só se vê bem longe das cidades grandes. E as pimenteiras da Neide, que mais parecem pinheirinhos de natal, estavam carregadas de frutinhas de formas e cores variadas. Um encanto! Difícil cozinhar sem essas danadas que dão tanto cheiro, calor, cor e sabor aos alimentos. Colhi, animada, um punhado generoso de cada “pinheirinho” e a Neide nem queria receber por elas, coisa de gente do campo, gente simples que tem valores diferentes... Em meio às malaguetas coloridas, às pimentas bodinho, às doces biquinho, às de cheiro, as bonitas pimentas cuiabanas grandes, de um vermelho-alaranjado e outras verdes, rechonchudas e apetitosas, reinavam absolutas. Perguntei se eram ardidas. “Insuportavelmente ardidas” foi a resposta dela e sorrindo, me garantiu que mesmo para um fanático por pimentas, só um pedacinho já seria uma experiência dolorosa, uma inteira seria fatal. Não resisti à tentação do desafio. Voltei pra casa com elas. Guardei-as, com carinho, na geladeira... Outro dia, depois de receber uma notícia chata, “empinei a carroça”, fui cozinhar pra me alegrar. Fiz um jantar pra um casal de amigos, pimenteiros feito eu. Servi como entrada, pimentas recheadas com queijo sobre uma salada verde. Usei as diabas da Neide. Loucura! Era um morde-e-assopra interminável. Estávamos corados e o suor frio abrandava, lentamente, a queimação... Teve quem recitasse de cor, Olavo Bilac. As vias respiratórias estavam desobstruídas. Ríamos à toa. Comemos as quatro pimentas inteirinhas... Foi um jantar delicioso e inesquecível! Neide, ainda estamos vivos!
Eis a receita original: 4 pimentas jalapeño, ¼ de xícara de queijo cheddar ralado, ¼ de xícara de queijo tipo suiço ralado, ¼ de xícara de cream cheese, 1 ovo, ¾ de xícara de cerveja, 1 xícara de farinha de trigo, sal e óleo vegetal para fritura. Faça uma fenda nas pimentas e retire as sementes. Reserve. Em uma vasilha, misture os queijos e recheie-as. Em outra vasilha, misture o ovo, a cerveja e a farinha de trigo para fazer uma massa. Mergulhe as pimentas na massa e frite-as em uma frigideira funda até ficarem douradas e crocantes. Bom demais! Bon appétit.

sexta-feira, 4 de março de 2011

FRUIT DE LA PASSION



Uma amiga me enviou um link. Abri e li: “Pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) estão acompanhando, há pouco mais de um mês, o desenvolvimento de um maracujá que cresce em formato de órgão sexual masculino. O fruto foi plantado há dois anos pela dona de casa Maria Rodrigues de Aguiar Farias, 53 anos, em um balde, no quintal de sua casa, em São José de Ribamar (MA).” Pois bem, segundo ela, o fruto em questão nasce ovalado como qualquer maracujá, mas depois se desenvolve com “aquele formato”. Um dos pesquisadores de recursos genéticos vegetais da Embrapa, Marcelo Cavallari, afirma que é a primeira vez que um fruto com tais características aparece no Maranhão e que a mutação genética seria a única explicação plausível para o fenômeno que, a meu ver, bem poderia ser chamado de maracujinto. Ele acrescenta: “Como todos os frutos têm o mesmo formato, a possibilidade de má formação é menos possível”. Má formação Sr. Cavallari?! E ele não para por aqui: “O aspecto é saudável, não está doente. Tirando o formato, é sadio.” Tirando o formato?! Mas o que há de errado com a forma do fruto?! A natureza é perfeita e sabe o que faz, sempre soube. Eu confio.
Dona Maria anda assustada com o alvoroço em torno da casa dela e ainda não abriu os portões do seu, digamos, Jardim do Éden maranhense para os pesquisadores. Mas o que é isso dona Maria?! Deixe os cientistas fazerem o trabalho deles! É para o bem de todos. O maracujá, todo mundo já sabe, é um ansiolítico natural e gostoso, a espécie maranhense então, nem se fala... Fico por aqui, imaginando uma plantação inteirinha do inusitado fruit de la passion e um bando de mulheres fazendo a colheita, felizes da vida! Será que a dona Maria me arruma uma mudinha?
Enquanto a felizarda dessa história não se decide, use o velho e bom maracujá redondinho pra fazer essa receita do chefe Olivier Anquier. O vinagrete de maracujá que pode ser usado para regar camarões ou uma salada. Anote: 1 maracujá grande, 1 colher de sobremesa de shoyu, 1 colher de chá de óleo de gergelim e 1 de mel. Basta peneirar a polpa da fruta para separar as sementes, juntar os outros ingredientes e misturar bem. Bon appétit.