quarta-feira, 29 de junho de 2011

DE MOLHO


Valha-me Deus, como alguns dias podem ser ácidos! Outro dia uma querida amiga me disse que estava “de molho”, tão forte era sua gripe. Respondi brincando que no caso dela, que é chef, “marinada” seria o termo mais apropriado. Esta semana, sou eu. Diabo de resfriadinho que vira resfriado, que vira sinusite, que vira gripe, que traz a dor de cabeça, a tosse, que inflama a garganta, esquenta o corpo, amolece os músculos, aniquila o olfato e mata de vez o apetite, qualquer apetite, todos eles. A vontade (se é que se tem vontades nesse estado) é mesmo de ficar de molho, aliar-se aos remédios, esperar o “bicho” morrer e resgatar aos poucos a saúde ferida. Passei a semana querendo colo, chá de mãe, caldinho leve, prontinho pra escorregar goela abaixo, sem esforço... Não tive colo nem chá de mãe (a minha não está mais nesse mundo), mas morrer de fome também não ia. Fui lenta e preguiçosamente pra cozinha, dia após dia... Segunda-feira, um caldinho de feijão com alho e pimenta me manteve viva. Na terça, foi um purê molinho com manteiga salgada que me sustentou. No meio da semana, uma panelinha de arroz basmati com meia-dúzia de dentes de alho, com casca e tudo, cozidos no arroz, espremidos e amassados depois pra virar um purezinho, me trouxe um alívio danado. Quinta-feira, mais repouso, mais comida reconfortante: sopa de legumes com caldo de galinha e açafrão... E a semana começada em preto e branco, ganhou uma corzinha, o nariz desentupido e o olfato de volta com o dom divino do gosto. Saúde é tudo! Fim de semana em família, um presente pra alma, pra compensar o desequilíbrio do corpo. Estou quase curada. Já tenho fome de comida de verdade. O sinal é bom. Estou virando vara de bambu que enverga, mas não quebra. Agora estão anunciando outra frente fria. Essa não me pega mais. Vou me fartar com bananas cozidas com especiarias que é um santo remédio e uma sobremesa que enche a gente de prazer... Providencie 2 bananas nanicas maduras por pessoa. Descasque e coloque-as inteiras em uma panela. Salpique canela em pó, açafrão, gengibre em pó e noz-moscada ralada. Coloque um quase nada de manteiga e um pouquinho de mel. Feche bem a panela sobre fogo baixo e cozinhe por 10 minutos aproximadamente ou até que as frutas amoleçam. Coma bem quente com uma bola de sorvete de creme. Delícia!
Bon appétit.

quarta-feira, 8 de junho de 2011

SABOREANDO UM SONHO

Ontem eu tive um sonho. Um daqueles tão reais que ainda tenho, bem nítidos, alguns detalhes. Vou contar. Eu estava lendo uma revista, recostada em uma poltrona, quando uma criança miúda, um menino de oito ou nove anos, aproximou-se de mim trazendo uma posta de peixe grelhado sobre uma espátula e disse: “Coma e depois me diga o que eu aprendi hoje.” E o nosso pequeno diálogo desenvolveu-se mais ou menos assim: “Mas que peixe é esse?” Perguntei. E ele: “É salmão, não está vendo?” “E o que você sabe sobre o salmão?” Continuei. “É um peixe dos mares e rios europeus. Ele permanece na água doce até os três primeiros anos antes de nadar para o mar, mas para se reproduzir volta à água doce, muitas vezes ao mesmo rio onde nasceu. Ele serve de comida para outros peixes, ursos e gente.” “Estou vendo que você aprendeu a geografia e a história do bicho.” Ele insistiu: “Prove!” Provei. Ainda posso sentir o cheiro marcante de grelhado, o gosto salgado das bordas tostadas e o doce da carne rosa e macia do salmão. Estava tão bom que enquanto mordia, minha sequencia de hummms provocava uma alegria incontida no menino. Ele dava gargalhadas, feliz com minha reação positiva. Perguntei-lhe como conseguira preparar um peixe tão gostoso. “Li a receita, ora!” Respondeu-me de pronto. Ele continuava sorrindo, os olhos brilhantes fitados em mim. Concluí: “Hoje você também aprendeu a doar-se, a vibrar com a alegria do outro, a ter prazer em oferecer.” E ele se foi. Acordei. E o que será que eu tenho que aprender hoje? Ainda não sei. Por enquanto só estou saboreando meu sonho. Deu uma vontade doida de comer peixe, do jeito que mais me apetece: en papillote, que consiste em embrulhar um filet de peixe em papel-manteiga, feito um bombom, assar e servir assim, empacotadinho, pro freguês. Pego uma folha de papel-manteiga, passo um bocadinho de azeite, preparo uma caminha de vegetais (tomate cereja, abobrinha, pimentão, cebola ralada, salsinha...), deito o filet de peixe, tempero com flor de sal, pimenta moída na hora, rodelas de limão e rego com mais azeite. Fecho bem o “bombom”, coloco no forno pra assar por uns 15 minutos e pronto. Faço um pacotinho por pessoa, claro! Sirvo com arroz ou com cuscuz ou com fatias de pão italiano. Divino! Bon appétit!

sexta-feira, 3 de junho de 2011

O SENHOR DOS CÍTRICOS










Outro dia folheando um livro lindo- O Brasil bem temperado- antes de dormir, li: “O limão-siciliano é o verdadeiro limão. As outras variedades são limas azedas. Originário da Pérsia, foi plantado na Sicília pelos Mouros.” Nunca havia pensado nisso. Fui atrás de mais informação. A história do “pai das limas azedas”, o senhor dos cítricos, me encheu de curiosidade. Confesso que nunca li tantos dados e datas desencontrados. Descobrir que sua origem é incerta me deixou ainda mais curiosa. Os primeiros registros datam de 3000 anos, nas florestas do Himalaia. Foi muito utilizado no início da Idade Média nos navios árabes e espanhóis como único remédio contra o escorbuto. O nome limão vem do italiano limone, do espanhol lima, do árabe laymûn, do persa limou. O termo lima teria sido mantido para designar o limão verde. Talvez aqui more toda a explicação ou toda a (con)fusão dos nomes do delicioso fruto.
Limão ou lima azeda? Melhor deixar pra lá e focar no que nos interessa: o que fazer com eles. E tem um montão de coisas boas!
Minha avó paterna dizia que em toda casa tem que ter milho (ela tinha um milharal no quintal), alho e limão. Sem os dois últimos, realmente, fico perdida, de mãos atadas. O limão é mesmo uma dádiva. Ele entra nas mais diversas receitas doces e salgadas. É um realçador do paladar sem precedentes. É insubstituível. Experimente fazer esse Creme de limão que pode ser conservado na geladeira, tampado, por 3-4 semanas e fica divino com frutas, tortas ou com o que você bem quiser. Misture, em uma panela antiaderente, 5 ovos batidos, 200gr de açúcar, 175ml de creme de leite fresco, raspas e suco de 3 limões lavados. Apure em fogo baixíssimo, mexendo sempre com uma colher de pau por 15-20 minutos, sem deixar ferver. Se preferir, cozinhe em banho-maria, mas fique sempre de olho na panela. Quando o creme atingir a consistência de maionese, apague o fogo e coloque em potes esterilizados. Deixe esfriar por 5 minutos antes de vedar. Depois deixe a conserva esfriar completamente e então guarde na geladeira. Depois de aberta, consuma em uma semana. É de arrepiar de bom! Bon appétit.

CALDO DE PINTO PRA ESQUENTAR

Tenho uma amiga que anda enlouquecida fazendo deliciosos brigadeiros-gourmet sob encomenda. E agora ela está pra lá de entusiasmada pra “gente” escrever um livro (isso quer dizer que eu vou escrever e ela vai me apoiar, esperta a moça!). Hoje ela me escreveu: “elma ve um dia ai q vc tem tempo e vamos começar colocar nossas ideias...se didi vagner escreveu sobre alguns lugares em nova york pq nós nao podemos escrever sobre nossos momentos gastronomicos...um cha de ibisco na arábia, o melhor grao de bico no jacob com um dono de virar a cabeça e fazer qq mulher comer alem da conta, ou nao comer...e por ai vamos..cafona?? as cafonices dão mais resultados.” E logo em seguida me enviou outro recado dizendo que em Porto Velho tem uma Sopa de pinto, deliciosa, que temos que fazer e colocar no tal livro. Pois bem, fui atrás do pinto, digo, da famosa sopa de pinto. Queria saber tudo e achar a melhor receita. Afinal, em se tratando de pinto, toda informação é valiosa. Achei Caldo de pinto. Segundo a Desciclopédia na Internet, o Caldo de pinto ou Caldim de pinto, como é carinhosamente chamado, é uma espécie de canja que deve ser tomada no inverno. Ela serve pra gente se esquentar e se livrar da gripe aviária, suína ou qualquer outro estado gripal desanimador. Sua origem é incerta, mas acredita-se que o glorioso caldo remonta ao homem das cavernas que colocou água para ferver (sabe-se lá pra fazer o quê) e que um franguinho que por ali ciscava, decidiu voar e pluft caiu bem no caldeirão de água fervente. E voilà, o homem das cavernas acabava de criar uma especialidade gastronômica: o caldim de pinto. Vale dizer que o referido homem era das cavernas de Minas Gerais, terra natal do prato... Confesso que jamais perdi tanto tempo com tamanha baboseira, porém como não só de pão vive o homem, melhor fazer a sopinha e rir dessa simpática história doida. Caldo de pinto combina com festa junina. Aproveite! Você vai precisar de 500gr de mandioca cozida (reserve a água), 500gr de peito de frango cozido e desfiado, caldo de galinha, 300gr de queijo mussarela ralado, 2 colheres de sopa de óleo, 2 dentes de alho amassados, 1 colher de sopa (rasa) de colorau, 1 lata de milho verde, cebolinha verde picada. Bata a mandioca no liquidificador com a própria água do cozimento. Em seguida, aqueça uma panela e coloque o óleo com o alho até ficar dourado. Junte o colorau e o “creme” de mandioca. Quando começar a ferver, acrescente o frango desfiado, o milho e o caldo de galinha. Deixe ferver mais um pouco. Sirva bem quente com queijo e cebolinha verde por cima. Bon appétit!

quarta-feira, 1 de junho de 2011

COMENDO AMBROSIA ÀS COLHERADAS

Comendo ambrosia às colheradas foi o que escrevi no meu perfil, em uma rede social, depois de chegar de uma pequena viagem de carro que fiz pra conhecer uma fábrica artesanal de panelas. Comprei uma senhora gamela de alumínio batido, lisinho e brilhante de dar inveja a muita prataria por aí. Coisa de roça, coisa mais linda! Mas, foi na volta para Cuiabá, em um bazar às margens da estrada, que me deparei com o sonho de consumo de todo cozinheiro: as panelas de pedra-sabão, muito populares no sul do país e em Minas Gerais. Aproveitei pra escolher uma, descansar um bocadinho, me recompor com uma rechonchuda fatia de melancia fresca e comprar um potinho do melhor doce do mundo: a ambrosia mineira. Retomei a estrada, cheguei em cima da hora pra trabalhar, feliz da vida! E como dever cumprido merece recompensa, a minha já estava geladinha à minha espera. Foram deliciosas colheradas de ambrosia que coroaram meu dia e aliviaram meu cansaço. Pois bem, dois dias depois de ter escrito a tal frase no meu perfil (o que rendeu um bocado de comentários de cúmplices na gulodice), uma amiga me disse, indignada, não ter conseguido ler a crônica do referido título... Mas que crônica Maria Rosa?! Não escrevi nada. Só contei em rede social o que estava comendo! Rimos um bocado. Ela não se contentou: “Pena. Sua frase daria um belo título e eu adoraria saber mais sobre esse doce.” Não podia deixar uma amiga-leitora aguada de vontade. Eis a melhor receita que conheço da guloseima. Ambrosia significa “manjar dos deuses do Olimpo que traz imortalidade”, sabia? Aproveite! Providencie 5 litros de leite pasteurizado, 1 kg de açúcar refinado, 9 ou 10 ovos frescos, pedaços de canela. Coloque o leite, o açúcar e a canela em uma panela e mexa bem para dissolver o açúcar. Leve ao fogo por 30 minutos sem parar de mexer para não grudar. Bata as claras em neve e depois de firmes, junte as gemas e continue batendo até ficar homogêneo. Derrame os ovos batidos sobre o leite, abaixe o fogo e deixe cozinhar por 20 minutos. “Corte” em pedaços e deixe ferver por mais 10 minutos. Repita a operação, sempre em fogo baixo. Mexa de vez em quando para não desmanchar os pedaços e raspe o fundo e as bordas da panela para não grudar. Conte aproximadamente 2 horas, diante no fogão, de olho no doce. Depois de pronto, coloque em uma compoteira e sirva gelado. Se quiser e puder, coma às colheradas! Bon appétit.

PITACO

Agora até minha secretária anda dando pitaco nos meus escritos. Outro dia ela me viu diante do computador e mandou ver: “Você não acha que já está na hora de dar uma receita legal pras festas juninas?” Respondi que eu não funcionava assim e que não era muito de seguir a ordem cronológica das coisas. Mas, cá estou eu, reconsiderando o pitaco e obedecendo às datas. Devo estar mudando. Afinal, nem todo pitaco é ruim. Pitaco de chef, por exemplo, geralmente dá bons frutos e tem até nome: o pulo do gato. Pitaco de gente querida também merece consideração e é chamado de conselho. Já pitaco de estranho é intromissão mesmo. O pitaco da minha secretária vai render uma conversinha boa e uma comidinha especial... Pensei nos Pãezinhos de Santo Antônio, o santo mais popular do Brasil, padroeiro dos pobres e santo casamenteiro. Faça os pãezinhos com 1kg de farinha de trigo, 30g de sal, 80g de açúcar, 100g de manteiga ou margarina, 120g de fermento biológico, 4 ovos e 300ml de leite. Misture tudo e sove bem. Dê forma aos pães e deixe crescer até dobrar de volume. Asse em forno preaquecido a 200 graus, até dourarem. Tem também as Rosquinhas de São João, o maior de todos os profetas. Na Europa, no dia da festa do santo (24 de junho), era organizado um grande encontro social para que moças solteiras e rapazes de posses se conhecessem. Santo Antônio casava as moças pobres, mas era para São João que as moças ricas faziam “simpatias” para arranjar um bom marido. Providencie 1kg de farinha de trigo, 1 e ½ copo de óleo, 2 copos de aguardente, 1 e ½ xícara de açúcar, 1 fatia de pão amanhecido, erva-doce, chá de canela. Frite o pão duro no óleo. Reserve. Depois de frio, misture os outros ingredientes (menos o chá) e sove bem. Faça as rosquinhas e coloque-as em uma assadeira untada e polvilhada. Asse até dourar. Depois de assadas, molhe no chá e passe no açúcar cristal. “Na noite de São João, dê uma esmola ao primeiro mendigo que encontrar, junto com duas rosquinhas. Pergunte o nome dele, pois esse, segundo a lenda, será o nome do seu futuro marido.” Dizem que realmente funciona. Prefiro não arriscar, pois sou capaz de me apaixonar pelo próprio. Já ouviu falar em dedinho podre?
Boas festas juninas! Bon appétit.