terça-feira, 17 de abril de 2012

FINGIMENTOS DA COZINHA

Agora estou às voltas com a palavra ‘fingir’ que quase sempre tem má reputação. Não se explica o verbo senão através de sinônimos: afetar, aparentar, simular, representar, arremedar, imitar, macaquear, parodiar, parecer, disfarçar, camuflar, dissimular, encobrir, inventar, fantasiar e por aí vai... Tem gente que faz isso com esmero e perfeição, dessa quero distância. É sobre outro tipo de fingimento que vamos conversar. Fingir na cozinha, segundo o chef Renato Freire, é usar e quase abusar de produtos e ingredientes naturais, prepará-los de modo específico com o intuito de simular receitas clássicas: “A culinária fingida brinca com a percepção sensorial das pessoas”. Renato Freire deixa bem claro que, imitar o aspecto, a textura, o aroma, e o sabor dos pratos através da substituição de ingredientes das receitas originais, não é ‘fraudar’ e sim, “transformar a cozinha em palco para mágicas e experiências divertidas”. Finge-se por puro prazer, é verdade, mas também por questões econômicas, culturais, geográficas, religiosas e por outras tantas... Nosso cozinheiro autodidata é também engenheiro químico e soube como poucos misturar dois excelentes ingredientes: o estudo das ciências e a herança culinária de sua família mineira. Só podia dar certo. E deu. O cara correu o mundo cozinhando, recebeu um montão de títulos e foi representante brasileiro no júri do Concurso Mundial de Gastronomia Bocuse d’Or, em Lyon, na França. Além disso tudo, é professor, escritor e tem cara de mandão. E daí? A gente tira o chapéu pra quem manda bem. Voltemos pra cozinha. Vou dar um exemplo clássico da culinária fingida: o popular marron glacê vendido em latas, nada tem a ver com a receita original que é à base de marrons, frutos do marronnier, uma castanheira portuguesa que não existe por essas bandas. A castanha é cozida em calda de açúcar e depois submetida a processo de secagem, um clássico da confeitaria francesa. E para aproveitar as castanhas que se quebravam durante a produção da iguaria, criou-se o crème de marrons. O doce em pasta, brasileiro, que é feito com batatas-doces, tentou imitar o creme, logo um doce fingido, eu diria até, fingidíssimo! Ainda não estou craque nos bons fingimentos da cozinha, mas você não perde por esperar. Bon appétit!

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