30 de dezembro. Nono dia depois do “fim”. Talvez você seja um dos poucos sobreviventes ao fatídico 21. Então lá vai: “Penúltimo dia do ano: dá a impressão de que vai haver uma grande mudança nas próximas horas, mas é apenas a vida seguindo seu curso e realizando a mágica de criar expectativas. Não é preciso ter pressa, mas aconselha-se não perder tempo... A pressa serve para concluir; o tempo, para desenvolver. A pressa atropela, o tempo desliza. A pressa é cega, o tempo enxerga longe. A pressa esconde, o tempo mostra. A pressa esfria, o tempo aquece...” As palavras são da Martha Medeiros e a ideia original é de José Saramago: “Não ter pressa não é incompatível com não perder tempo.” E a minha intenção é dizer que temos que fazer o que sempre fizemos, o tempo todo, todo o tempo: recomeçar mais uma vez. E já não está de bom tamanho? O grande final não me assusta; conviver com as muidezas, sim. Em ambos os casos, o ingrediente principal é a coragem. E quer saber, coragem me lembra o povo forte da Bretanha francesa e a especialidade dessa região bonita no extremo oeste da França: o Far Breton, uma espécie de bolo macio pra comer como sobremesa ou na hora do lanche (ou as três da madruga no meio da insônia). Um dos bolos mais saborosos que já provei. Não vejo melhor maneira de recomeçar, seja lá qual for o recomeço. Vou te dar minha receita preferida, como presente de fim de ano. Anote: 250g de ameixas secas sem caroço, 4 colheres de sopa de rum, 5 de farinha de trigo (bem cheias), 3 de açúcar, ½ colher de café de sal, 3 ovos, ½ litro de leite quente, 30g de manteiga (para untar). Coloque as ameixas para macerar no rum algumas horas antes de começar a preparar o far. Preaqueça o forno a 200 graus. Na tigela da batedeira misture a farinha, o sal, o açúcar e os ovos. Junte o leite aquecido e bata tudo até obter uma massa lisa e fluida. Desligue. Junte as ameixas (com o rum da maceração) e misture levemente. Unte um refratário (bonito!) e despeje a massa. Coloque no forno por aproximadamente uma hora (reduza a temperatura depois de 30 minutos). Sirva o far ainda morno no próprio refratário. Recomeço mais reconfortante que esse, não há. Feliz 2013 (estou apostando nisso!) e bon appétit sempre!
segunda-feira, 17 de dezembro de 2012
segunda-feira, 10 de dezembro de 2012
E FOI DADA A LARGADA
É dezembro de novo. E foi dada a largada para as festas de fim de ano: confraternizações entre colegas de trabalho; despedida temporária entre professores e alunos; Natal em família e enfim o tão esperado Réveillon entre amigos, namorados, amantes, ficantes ou candidatos a qualquer outro modelito de relacionamento. E dá-lhe amigo-secreto, com lembrancinhas, beijos, abraços, docinhos! Sem mencionar as formaturas e os casamentos aos quais você está intimado... O que essas festas têm em comum? Co-mi-da. Você vai comer, por bem ou por mal, vai ter que provar um tiquinho de cada prato “especial” (ou vai fazer tamanha desfeita?). Prepare-se, a oferta é imensa! Os supermercados já estão abarrotados; os carrinhos lotados; as pessoas, alegres, já sabem que vão se empanturrar de coisas gostosas e se acabar nas bebidas borbulhantes. Já estão todos salivando. É o fim de mais um ano. Demos conta. Escapamos. Ainda estamos vivos. Viva! Aproveite as horas de preparação, aquelas que antecedem a grande comemoração, já que o melhor da festa é esperar por ela, e o pior é ter que comer as sobras, durante dias, depois da comilança desmedida. Pode parecer estranho, mas é a época em que menos tenho apetite e a preguiça de cozinhar dá as caras. Os exageros matam minha vontade e pensar no desperdício enfraquece meus ânimos. Não gosto do peru, de pernas pro ar, pagando o maior mico no centro da mesa natalina; sobre minha mesa festiva nunca teve leitão, assado inteiro, com maçã na boca; cruzes, nunquinha!; frutos do mar só se as águas salgadas estiverem a poucos quilômetros da minha cozinha... Nestes derradeiros dias de 2012, vou caprichar na simplicidade e nos ingredientes. Quem estiver comigo vai comer castanhas, frutas secas, frutas nevadas (não tem como não fazer todo ano, é tão lindo!); bruschettas de queijo brie com damascos e hortelã; compota de cebola e laranja sobre fatias de pão italiano e pão sírio; massa bavette ao sugo com almôndegas de peru e manjericão fresco; arroz para carreteiro com linguiça suína picante e cebola pérola caramelizada com azeite e açúcar mascavo; torta rústica de maçãs, mousse de chocolate meio-amargo; pão de ló de laranja da minha mãe pra coroar o café com Cointreau. Depois é só agradecer as bênçãos. Uma delas é poder comer alegremente e digerir naturalmente, mas são tantas, tantas... Repare. Feliz Natal! Bon appétit!
segunda-feira, 3 de dezembro de 2012
À ESPERA DA LINGUIÇA DO JACÓ
A história é meio confusa, mas vou tentar organizar os fatos. Vamos ver no que vai dar. Tenho uma aluna de francês que é uma graça de pessoa: mignon no tamanho, gigante na gentileza; conversa pouco, mas, no meio do papo, sai com frases cheias de efeitos; ela é natural. Acho mesmo é que ela pensa em voz alta. Outro dia, em sala de aula, falávamos das comidas que fazem parte do cotidiano dos franceses, mas que têm origens diversas. Tudo começou com a origem do couscous: uma especialidade dos países muçulmanos da África do Norte, do Maghreb, à base de sêmola de trigo, caldo de legumes (tomates, abobrinhas, cenouras...) e grão-de-bico, servida com carneiro, ou frango, ou brochettes de cordeiro, ou ainda saucisses merguez. Expliquei que as merguez são saborosas linguiças picantes feitas com carne bovina e muito tempero. Acrescentei mais algumas curiosidades e disse que eram minhas favoritas. Foi então que a coisa toda aconteceu. Minha aluna, que já me presenteou com peças fabulosas de filé de boi, um baita carneiro, quis me agradar mais uma vez e soltou: “Então você vai adorar a linguiça do Jacó!”. Gargalhadas em coro, observações dúbias... E lá se foi um pedaço da aula por conta de uma linguiça. Quem se importa com a tal merguez se a linguiça do Jacó é tão boa quanto? Cara amiga, dessa você não escapa, se vira pra nos oferecer a linguiça do Jacó, estamos esperando com água na boca; prometo fazer um acompanhamento à altura e dividir com todo mundo; sou gulosa, mas não sou mesquinha, sei compartilhar o que é bom. Enquanto a linguiça do Jacó não vem fazer as vezes da deliciosa linguiça dos muçulmanos, vamos caprichar no couscous. Os melhores couscous são sempre cozidos com caldo caseiro de legumes; acrescidos de uma boa colherada de manteiga para “soltar” os grãos de trigo; levam muita cebola, grão-de-bico, passas brancas sem sementes, lascas de amêndoas e um tiquinho de água de flor de laranjeira, na hora de servir, para perfumar delicadamente o prato. Faça um frango ao molho pra acompanhar (eu coloco sempre um pouco de canela em pó no final do cozimento) e sirva assim: Coloque a “duna” de couscous em um belo recipiente de cerâmica, no centro da mesa e uma porção de frango ao molho, em uma tigelinha, ao lado de cada conviva. Cada um se serve à vontade. Isso é bom demais! Bon appétit.
dezembro de 2012
dezembro de 2012
segunda-feira, 19 de novembro de 2012
MANGULÃO
Outro dia acordei com saudade dos gostos da minha infância. Mais precisamente do mangulão que minha mãe fazia pra molecada em alguns fins de semana. Mangulão é uma espécie de bolo rústico, um pão deliciosamente grosseiro, um pudim seco e gigante. Dourado e mais que crocante, quase duro, por fora; macio e puxento por dentro. Dizem que é um bolo de queijo que nasceu no nordeste, pode até ser, já que passei um pedaço da minha meninice no interior da Bahia e foi lá que comi mangulão pela primeira vez. Só sei que é daquelas comidas inesquecíveis- pra matar de vez a fome gulosa- preparadas com poucos ingredientes, que todo mundo tem na despensa de casa: polvilho, óleo, ovos, leite... Fui atrás da cadernetinha de receitas que herdei da minha mãe. Lá estava o que ela chamava de “receita”. Era mais um lembrete dos ingredientes com as medidas em xícara ou copo. Nada de gramas ou modo de preparo. E agora? Quem tem intimidade com a cozinha, que se vire! Vou transcrever ipsis litteris o que encontrei nas derradeiras páginas, amareladas e manchadas de óleo, do velho livreto: Mangulão: 4 xícaras de polvilho, 1 xícara de óleo, 2 xícaras de água, 6 ovos, 1 copo de alumínio de leite, 1 pitada de sal. Molha o polvilho com a água e o sal (ponto p/ beiju). Passa na frigideira, amassa com o leite e os ovos. Pronto. Era só o que tinha pra preparar o mangulão. Mas, você sabe, em tempos modernos, quem não tem mais mãe, chora pro Google; e lá fui eu fuçar pra achar um passo a passo mais real do tal bolo. Só encontrei receitas que levam queijo. Testei uma que deu certo. Deu certo, certíssimo, mas nada de matar minha saudade... Fazer o quê, mão de mãe não tem igual. Anote aí: 3 ovos inteiros, 150ml de óleo, 125ml de leite, 250gr de polvilho doce, sal a gosto, 1 colher (sopa) de fermento em pó, 200gr de queijo minas curado ralado. Bata os 5 primeiros ingredientes no liquidificador. Despeje em uma vasilha, junte o fermento e o queijo e misture bem. Verta em forma redonda com furo no meio, untada com óleo. Leve ao forno médio, pré-aquecido, por aproximadamente 40 minutos ou até ficar bem dourado. Sirva quente. Quando esfriar poderá ser aquecido novamente no forno. Lembro-me bem de quase queimar as mucosas, e a casquinha dura espetar o céu da boca; e tudo bem mastigado descia gostosamente com goles mornos de café com leite adoçado. Bon appétit.
terça-feira, 13 de novembro de 2012
ROENDO AS UNHAS
Agora sim, estou inclinada a crer no fim dos tempos. Antes nada me fizera acreditar no fatídico 21 de dezembro deste ano, até chegar a Goiânia, capital nacional do pequi... Ali se nasce e se cria com o cheiro forte do pequi nas narinas; come-se antes só o arroz amarelinho, tingido e perfumado pela polpa saborosa do fruto; depois se aprende a roer o perigoso caroço espinhento por dentro; lambem-se os dedos; aí sim, estamos perdidos de paixão por esse alimento tão peculiar. Somos goianos. Somos doidinhos por pequi. Má notícia: o pequi anda escasso por aquelas bandas. Os pequizeiros de Goiás não são mais os mesmos. Não é fofoca nem especulação. Antes fosse. Pior: temos culpa no cartório. É castigo, só pode. O fato é que, com o desmatamento (tudo em nome do progresso, claro!), as araras e outros pássaros famintos estão apelando para as flores dos pequizeiros como fonte de alimento. Os goianos estão roendo as unhas. Não por medo de morrer antes de ver os ares de 2013, mas como viver nesse mundo sem pequi? É nossa personalidade e nosso orgulho que estão em jogo. São marcas de infância, de milhares de pessoas, que se apagarão. Tente explicar pra alguém, que jamais provou a polpa carnuda do pequi, seu gosto marcante, singular e viciante. Impossível. Pra saber tem que roer. Roer até amarelar as pontas dos dedos e tingir os dentes. Pescar os últimos caroços no fundo da panela e roer. Roer. E que Deus nos perdoe pela gula e pelo arroto. Faça a Panelinha goiana, pra matar a saudade de Goiás. Use 1 copo e ½ de arroz, óleo para refogar, 150gr de costelinha de porco em pedaços pequenos, 150gr de peito de frango em cubos, 150gr de linguiça caseira picada, 1 espiga de milho verde (retire os grãos do sabugo com faca afiada), 3 colheres de palmito picado, algumas fatias de queijo coalho, alho, cebola, sal, pimenta verde, pimenta de cheiro e cheiro verde a gosto. Refogue as carnes começando pela costelinha até dourar. Retire o excesso de óleo se necessário. Coloque os temperos (menos o cheiro verde) e refogue mais um pouco. Junte o palmito e o milho. Acrescente o arroz e refogue bem. Coloque água até cobrir o arroz e cozinhe em fogo brando. Quando o arroz secar, cubra-o com as fatias de queijo. Decore com rodelas de palmito ou com cheiro verde. Abafe e sirva em seguida. É, sei, nessa receita não tem pequi. Melhor se acostumar, vai que... Bon appétit.
terça-feira, 6 de novembro de 2012
TEMPERAMENTO ARDIDO
A frase, atribuída à senhora Lispector na página 73 da revista diVino Sabores (Edição 34) , é: “No meu temperamento tem um pouco de pimenta: não é todo mundo que gosta, nem todo mundo que aguenta.” Duvidei. Fui atrás. Achei: “No meu temperamento vai um pouco de pimenta. Não é todo mundo que gosta, não é todo mundo que aguenta.” De Pedro Pondé. E agora? A frase, ordinária e direta, está mais para Pondé que para Clarice. E até poderia ser minha, sua ou de qualquer outro mortal que assuma seu temperamento ardido. São os dissabores da Internet, da informação compacta e rápida, sem fonte límpida. Quem se importa? É o Google engolindo os livros, o micro-ondas tomando o lugar do velho forno caseiro. É a pressa. Ganhar tempo é a meta. Não ter tempo é chique. Tê-lo é quase vergonhoso. Será que dá pra fazer poupança de tempo? Ganhar agora e já, pra gastar depois, quando se estiver gagá? Corrida insana... Isso não é pra mim. Bora falar de pimenta que é mais a minha cara. Saiba que a pimenta é o segundo tempero mais usado no mundo (o sal é o primeiro). Mas a história da pimenta-do-reino é particularmente especial. Natural da Índia, esse grãozinho redondo e ardido tem três variações comercializadas: a preta, a branca e a verde. Para se ter a pimenta verde, os cachinhos devem ser colhidos antes do amadurecimento total e os grãos são colocados em salmoura, em vinagre ou em azeite, para conservar seu frescor, e são sempre utilizados inteiros nos preparos. Herbácea, ácida, fresca e picante, a pimenta verde é um show de tempero! Aqui vai uma receita clássica da cozinha francesa: o Steak au Poivre (Medalhão de filé com Pimenta verde). Bom demais quando bem feito. Para 2 pessoas: tempere 2 medalhões com um pouco de sal e pimenta preta moída na hora. Numa frigideira de fundo grosso, aqueça 1 colher de manteiga e 1 de azeite e sele os filés dos dois lados. Reserve a carne coberta com papel alumínio. Na mesma frigideira, coloque 3 colheres de manteiga e 3 de azeite, 1 cebola picada, ½ cenoura picadinha, 1 dente de alho amassado e 1 tomate maduro sem pele cortado em cubos. Refogue bem. Junte 1 colher de pimenta verde e pressione-as com o dorso de uma colher. Mexa. Retire do fogo e coloque ½ xícara de vinho tinto seco. Misture bem. Volte ao fogo (baixo) até o álcool evaporar. Enquanto isso dissolva 1 colher rasa de amido de milho em uma xícara de caldo de carne e verta na panela. Ferva até reduzir à metade. Coloque os filés, mais 1 colher de pimenta verde e cozinhe por alguns minutos. Sirva os filés sem os legumes (tomate, cenoura...), só com o molho e as pimentas. Bon appétit.
terça-feira, 30 de outubro de 2012
MULHERES COM APETITE
“Os franceses sempre souberam o que eu suspeitava há muito tempo; não existe nada mais sexy do que observar uma mulher comendo. Os homens adoram isso... É simples: mulheres que apenas tocam na comida odeiam sexo. Mulheres que sugam a carne das patinhas das lagostas, pedem (e terminam) a sobremesa, estas são as que vão arrancar a sua roupa e voltar para o segundo tempo.” A, digamos, teoria é de Elizabeth Bard, descrita com muito bom-humor no capítulo Moças que almoçam, em seu apetitoso livro, Almoço em Paris. E ela ainda afirma que quando o cara certo aparecer, nós, as mulheres com um sacré-appétit, o devoraremos como um sundae com calda de chocolate. Resta saber o que ela quis dizer com O cara certo, mas isso deve estar em outro livro... Amanhã, 31 de outubro, comemora-se o Dia das Bruxas, que bem poderia ser consagrado também às cozinheiras, que de magia e bruxaria são entendidas. Escolhi uma receita mágica pra homenagear as bruxas-cozinheiras e as cozinheiras-bruxas, bem como as bruxinhas atrevidas e gulosas que gostam de travessuras e doces: Banana pudding. Esta maravilha de banana provocou uma verdadeira legião de fãs da confeitaria vintage mais querida de Nova York: a pequena Magnolia Bakery, no West Village. O doce é uma espécie de pavê cremoso, de aparência caseira e de sabor divino que leva à compulsão. Seu preparo não requer muita prática, nem muita destreza. Vai ver que é só bruxaria mesmo. Vale a pena testar. Para seis porções, providencie 1 lata de leite condensado, 1 e ½ xícara de chá de água, 2 caixinhas de pó para pudim sabor baunilha, 3 xícaras de chá de creme de leite fresco, 2 pacotes de biscoito leite e mel ou maizena ou maria, 4 xícaras de chá de bananas (prata ou nanica) maduras em rodelas (corte só na hora de montar para que não escureçam). Faça assim: numa panela, junte o leite condensado, a água e o pó para pudim. Leve ao fogo e mexa bem até ferver. Tire do fogo e reserve coberto com filme plástico na geladeira por 3 horas. (Vá ler um livro, ver um filme, sei lá...) Depois disso, bata o creme de leite em ponto de chantili firme. Tire o creme da geladeira e bata um pouco à mão para amaciá-lo. Junte o chantili mexendo delicadamente até que incorporem. Escolha um recipiente bonito e monte o doce assim: camada de biscoitos, camada de rodelas de banana, camada de creme. Repita até terminar o creme. Decore com farelos de biscoitos e bon appétit!
terça-feira, 23 de outubro de 2012
CAIPIRA NA COZINHA REFINADA
Nunca tinha ouvido falar até abrir o Almanaque Brasil, de cultura popular, em um voo Cuiabá-Brasília. Fui direto pra coluna que me interessa, no final da revista: Em se plantando, tudo dá. A bola da vez era o “mangarito”. O artigo começa assim: “Ele está de volta. Cultivado aqui e ali por gente simples, em quintais, ele quase desapareceu das mesas. Agora vem conquistando chefes estrelados. De sabor delicado, peculiar, inspira novos pratos e cativa clientes da cozinha refinada. Quem apostar nele pode se dar bem”. Parece que o mangarito, esse tubérculo que faz parte da alimentação dos índios há milhares de anos, esteve em vias de desaparecer, possivelmente, por conta de outra raiz: a popular batata. Ele pertence à cozinha caipira e foi redescoberto por chefs de renome, sempre em buscas de novos sabores. Mas foi graças a João Lino Vieira, que passou a cultivar o mangarito em larga escala em 1985, que o tubérculo ressurgiu das cinzas. João tinha saudades desse gosto gostoso da infância... Li que o tal mangarito é da família do inhame, tem sabor amendoado, uma leve acidez e uma textura cremosa. Agora sei que é amarelinho. Imagino que seu sabor oscile entre o da castanha portuguesa, da batata inglesa, da batatinha salsa e do cará... Mas parece que a delícia caipira custa “10 vezes mais caro que a batata, mas dá de 10 a zero em sabor”. Vamos torcer pro mangarito cair nas graças da boca do povo, a produção aumentar, e o preço cair. Enquanto isso, vou atrás do meu, coûte que coûte. E mais: as folhas são ricas em vitamina A e podem ser refogadas com um pouco de azeite, alho e sal, feito folhas de couve. Estou aguada de vontade! Achei uma receita de Tamboril (Peixe-sapo) com purê de mangaritos, do chef Ivan Achcar, pra comer de joelhos. Anote: 2 filés de tamboril limpos, 1 xícara de ervas mistas frescas (manjericão, sálvia, salsa, tomilho), sal grosso, pimenta moída na hora, 3 colheres de azeite, 8 mangaritos médios lavados, 2 colheres de manteiga, 50ml de leite de coco. Cozinhe os mangaritos com casca até ficarem macios. Enquanto isso, tempere os filés com as ervas, o sal, a pimenta, moídos juntos num pilão. Reserve. Preaqueça o forno em temperatura média. Escorra os mangaritos e retire a casca. Amasse-os até obter um purê. Reserve. Numa frigideira aqueça o azeite e sele os filés. Transfira para uma forma e leve ao forno por 20 minutos. Finalize o purê de mangaritos com o leite de coco, a manteiga e um pouco de sal. Leve ao fogo baixo sem parar de mexer para incorporar bem. Corte os filés em 4 porções e sirva com o purê de mangaritos. Bon appétit.
quarta-feira, 17 de outubro de 2012
AS COMIDINHAS DA VINGATIVA NINA
Não há como negar: as novelas fazem parte da cultura brasileira. Até quem não gosta (ou pelo menos finge não gostar) vai parar tudo pra ver os últimos capítulos da novela do horário nobre da Rede Globo, apesar das esquisitices da trama: a menina esperta deixada em um lixão do Rio nem pensou em fugir ou chamar a polícia; em seguida é adotada por uma família argentina e depois de dez anos volta para o Brasil falando “carioquês” com a maior desenvoltura; sem falar no português impecável de suas hermanas de criação... Estranhices à parte, vamos ao que interessa. A atriz Débora Falabella, que faz o papel de Nina, uma Chef de primeira linha em Avenida Brasil, teve que fazer um bocado de horas de aula de culinária para portar-se como mestre-cuca na cozinha bacana da megera Carminha. Aprender a manusear facas afiadas, a cortar cebolas, a preparar massas e até trabalhar, incógnita, em um festão pra 400 pessoas, organizado por um buffet renomado, foram provas da dedicação da moça. Evidentemente, os pratos que desfilaram sobre a mesa dos suburbanos de fino trato, não foram preparados pela atriz, mas eram comidas de verdade, receitas clássicas, escolhidas a dedo pelo autor da novela que tem fama de gourmet: Ovos Benedict, Cordeiro com Molho de Hortelã e Batatas no Alecrim, Babá ao Rum são alguns exemplos que arrancaram suspiros dos comilões da novela. Que tal preparar um desses pra saborear, comme il faut, o último capítulo da telenovela? Escolhi os ovos, cuja receita é do Chef Emmanuel Bassoleil. Para o Molho Holandês: 3 gemas, 3 colh. sopa de água quente, 175gr de manteiga clarificada, suco de ½ limão, sal e pimenta-do-reino branca moída na hora. Ovos: 4 ovos pochés, 4 fatias de pão tipo brioche, 8 fatias finas de presunto cozido, uma gota de vinagre. Prepare o molho: em fogo baixo, bata com o fouet as gemas e a água quente, por 3 minutos para a mistura emulsionar. Adicione aos poucos a manteiga clarificada, batendo vigorosamente, até obter uma consistência cremosa. Retire do fogo, continue batendo, junte o limão, o sal e a pimenta. Prepare os ovos pochés: abra-os com cuidado em água fervente com a gota de vinagre e cozinhe-os em fogo brando. Retire-os quando a clara estiver consistente e a gema ainda mole. Montagem: Em uma assadeira, torre ligeiramente as fatias de brioche. Coloque 2 fatias de presunto sobre cada fatia de brioche e sobre o presunto, os ovos pochés. Cubra tudo com o molho holandês, leve ao forno apenas para gratinar. Retire e decore com ciboulette e salsinha crespa. Sirva em seguida. Bon appétit.
terça-feira, 9 de outubro de 2012
O CINEMA VAI À MESA
Dizem que são três os maiores prazeres da vida: comida, sexo e cinema (talvez não nessa ordem, mas isso é só uma questão de apetite). Outro dia pensei em fazer uma lista de filmes, com histórias envolventes que envolvessem os prazeres da comida. Queria rever alguns e ir em busca de outros. A ideia é ter uma videoteca culinária proporcional à minha apetitosa biblioteca. Foi quando me deparei com “O Cinema Vai à Mesa”- Histórias e Receitas. Rubens Ewald Filho, Nilu Lebert e cozinheiros renomados já haviam feito todo o trabalho para mim e para centenas de milhares de pessoas “que adoram ler receitas. Divertem-se com isso.” O mesmo pode acontecer com o cinema. Assistir a um bom filme; executar uma única receita que seja; degustar o prato, é prolongar um momento de prazer, sobretudo se for compartilhado. O livro traz um roteiro cinematográfico de vinte e quatro obras selecionadas (mais um capítulo: Ação de Graças no Cinema) que refletem a intenção dos autores: fazer com que os leitores viajem pelo mundo do cinema e da gastronomia. Um banquete cinematográfico de encher os olhos e dar água na boca. É só degustar: “Felizmente, cada vez que bate a desilusão com o estado atual do cinema, acontece um milagre e surge um grande filme, que nos relembra que essa arte não está morta, que existem ainda grandes cineastas capazes de fazer grandes filmes. É o caso deste inesperado O Jantar (La Cena), do genial diretor italiano Ettore Scola, uma obra comovente até mesmo porque nos faz lembrar os grandes momentos do cinema italiano, da comédia italiana, quando a produção de fitas humanas, sensíveis, engraçadas, profundas e simples como esta era normal.” Que tal locar o filme, chamar os amigos e preparar uma refeição pra depois? Berinjela à Parmiggiana. Faça com 3 berinjelas, farinha de trigo para empanar, 300gr de mozarela de búfala, 100gr de parmesão ralado, 300ml de molho de tomates frescos ou pelatti, folhas de manjericão, um bom azeite, óleo de girassol para fritar, sal a gosto. Corte as berinjelas em fatias de 0,5cm no sentido do comprimento, tempere-as com sal e passe uma a uma na farinha de trigo. Frite-as em óleo abundante e bem quente. Deixe descansar sobre papel absorvente por 20 minutos. Em um refratário monte camadas: molho, queijo ralado, manjericão, azeite, berinjela, mozarela... Cubra tudo com molho e mozarela, salpique parmesão e leve ao forno por 20 minutos para gratinar. Bon appétit.
sexta-feira, 28 de setembro de 2012
CHOVE CHUVA
Chove chuva, chove sem parar. É água que cai do céu. Complica mais o trânsito que já está um caos. Molha o que sobrou das calçadas da “cidade verde”, sem árvores. Encharca as ruas e ruelas desestruturadas. Faz lama. Tinge os carrinhos e os carrões de marrom. Lambreca tudo. É, está todo mundo na mesma lama... Não dá pra reclamar. É a chuva do caju, dizem uns; é a chuva da manga, dizem outros. É chuva de água, ora, faz bem. Então agora é só esperar? A água da terra molhada será sugada pela planta pra engordar a fruta mirrada. Ela ficará pesada. Envergará o galho. Cairá. E aí a gente sucumbe à tentação. É tentação de todo jeito: pela cor, pelo cheiro, pela memória do sabor... Até a brilhante escritora norte-americana, Elizabeth Bishop, sucumbiu aos encantos do caju, à consistência suculenta dessa fruta intrigante. Foi no início da década de 50, em passagem pelo Rio de Janeiro pra visitar uma amiga. A poetisa deliciou-se com a fruta que lhe provocou uma alergia danada, impedindo-a de seguir viagem. Ficou quinze anos no Brasil, evidentemente, não foi só por conta da fruta nem da alergia, mas isso é outra- bela- história da qual vale a pena inteirar-se, acredite. Agora é a vez do caju. Essa receita deliciosa leva uma crosta de castanha de caju que faz toda a diferença no assado. Anote: 1 costela de porco, 1/3 de xícara de chá de castanha de caju, 4 colheres de sopa de geleia de laranja ou damasco, 1 xícara de chá de vinho branco seco, 2 cebolas roxas, 3 maçãs, 6 dentes de alho, ramos de alecrim, sal e pimenta moída na hora. Preaqueça o forno em 220°. Tire o excesso de gordura da costelinha. Ponha em uma assadeira e tempere com o sal e a pimenta. Soque no pilão, 1 dente de alho com ½ colher (chá) de sal até obter uma pasta. Junte a geleia e misture bem. Espalhe essa mistura sobre a costela. Triture as castanhas de caju até obter uma farinha grossa e salpique sobre a carne. Faça um leito com os ramos de alecrim sob a costela. Leve ao forno por 20 minutos. Enquanto isso, descasque os dentes de alho e as cebolas. Corte as cebolas e as maçãs em 4 partes. Retire a assadeira do forno e reduza-o para 160°. Complete a assadeira com os vegetais e o vinho. Cubra com papel alumínio e volte para o forno por mais ou menos 2 horas. Depois corte as ripas da costelinha e sirva-as com os vegetais. Uma caipirinha de caju cai bem antes da refeição. Bon appétit e tomara que chova mais!
segunda-feira, 24 de setembro de 2012
NUTRIÇÃO COMPLETA
O que fazer dos nossos “altos e baixos” senão vivê-los um a um? A busca do equilíbrio levou-me a muitos caminhos e, hoje, trouxe-me até aqui. E como forma de agradecimento, vou transcrever trechos de um dos mais agradáveis textos que já li. Ele está na Bíblia da Mulher (um presente da minha filha querida). Nutrição completa é o título. “A descrição de alimentos é encontrada em toda a Bíblia... Como nos dias de Salomão, o mesmo acontece em nossa sociedade altamente estressada: refeições tranquilas auxiliam tanto na digestão quanto na boa disposição. Talvez o meio mais eficiente para criar um ambiente de paz e de graça às refeições seja habituar-se a convidar Deus para estar presente. Oferecer uma oração de ação de graças junto com a família antes de começar a comer gera uma atitude de gratidão e paz... Até mesmo quando comemos sozinhas, a hora da refeição pode ser um momento de descanso, de reflexão sobre as bênçãos de Deus ou de apreciação de um belo cenário. As mulheres têm particularmente sido associadas à alimentação... Por exemplo, a “mulher virtuosa” ou “mulher forte” dispõe-se a despender um grande esforço para alimentar sua família... Não existe momento mais bonito para alimentar a família e qualquer outra pessoa do que as refeições comuns do dia-a-dia, que proporcionam sustento físico e nutrição espiritual. Irmão Lourenço, um monge da ordem dos Carmelitas descalços e humildes do século XVII, verbalizou a oportunidade especial de servir, na hora da refeição, na seguinte oração: “Senhor de todas as caçarolas, panelas e coisas..., torna-me santo preparando refeições e lavando pratos! O período de trabalho, para mim, não difere do período de oração, e no ruído e estrépito de minha cozinha... eu me aproprio de Deus com tanta tranquilidade como se estivesse de joelhos para receber o santo sacramento.”” Você sabia que o “livro” de culinária mais antigo data de 4.000 anos? São três tabletes cerâmicos. Ali consta uma receita de cozido: Pegue um pouco de carne. Prepare água, ponha gordura, depois acrescente... alho-poró e alho, tudo bem triturado junto e um pouco de shuhutinnu (provavelmente cebola). Um dos tabletes tem vinte e cinco receitas: quatro pratos vegetarianos e vinte e um pratos com carnes (veado, gazela, carneiro, pombos...).
Bon appétit!
Bon appétit!
quarta-feira, 19 de setembro de 2012
BICHO CURIOSO
Ganhei um livro da Roberta Malta Saldanha, quero dizer, escrito por ela, presente da minha nora. A Roberta começou sua carreira na Editora Abril, fez um percurso pra lá de proveitoso até descobrir sua paixão pela gastronomia, quando foi convidada a por o “Boa Mesa”, ou melhor, a meter a mão na massa e a planejar tintin por tintin esse primeiro grande evento gastronômico do Brasil. E mais: pesquisou e elaborou o Dicionário tradutor de gastronomia em seis línguas, lançado em 2007. O livro que ganhei é sobre curiosidades gastronômicas, coisa que sempre me dá água na boca. Gosto de história. As verdades e as lendas (que também são verdades de outro jeito) que envolvem as comidas, essas são minhas favoritas. Quem faz a apresentação da obra é outro escritor e pesquisador da história da culinária, Breno Lerner. É daquelas apresentações de aguçar os apetites: “A curiosidade matou o gato, diz o antigo refrão, mas impulsionou o homem a buscar novas fronteiras. Toda história humana passa, em algum momento, pela cozinha, e este bicho curioso, o homem, a todo momento a fuçar e procurar novos ingredientes e temperos, acabou por dar a volta ao mundo, descobrir novas terras e novos continentes, guerrear por um punhado de pimenta ou invadir um país por uma plantação de chá.” Mal comecei a ler o livro e cá estou eu, cutucando outro bicho curioso... Fiquei sabendo que o frango capão, famoso por sua carne delicada e saborosa, só existe, hoje, graças a Caio Cânio, um cônsul romano, dorminhoco, nascido em 19 a.C. Irritado com a barrulheira dos galos na madrugada, o referido cônsul (que devia ser um bon-vivant), conseguiu que o senado aprovasse uma lei proibindo a presença das aves na cidade. Os criadores dos bichos, logo acharam um “jeitinho romano” pra burlar a lei e resolver o caso sem prejuízos e záz, castraram os coitados dos galos. Era sabido que a ave castrada parava de cantar, mas a surpresa veio logo depois: os pobrezinhos começaram a comer compulsivamente (e lhes restavam outros prazeres?) e engordaram muito. O frango capão pode pesar até 2,5kg com sete meses e quando abatido, é uma das mais deliciosas carnes. E a gente aqui comendo frango de granja... Bon appétit se o seu for um capão criado caladinho, mas solto, soltinho, pelo menos isso.
terça-feira, 11 de setembro de 2012
MAS QUE CALOR ÔÔÔ ÔÔÔ

terça-feira, 4 de setembro de 2012
ESTOU TENDO UM CASO

segunda-feira, 27 de agosto de 2012
TEMPERANDO SALADAS

quinta-feira, 16 de agosto de 2012
EU ODEIO COZINHAR

terça-feira, 14 de agosto de 2012
DOIS CRIMES, UMA TORTA

segunda-feira, 6 de agosto de 2012
MEMÓRIA GUSTATIVA

.
quarta-feira, 4 de julho de 2012
FOI SOPA!

AVGOLEMONO

terça-feira, 3 de julho de 2012
PRA QUEM NÃO GOSTA DA COISA TÉPIDA

VOCÊ VAI DE BISQUE, POTAGE OU VELOUTÉ?

quarta-feira, 27 de junho de 2012
PARA AS FÉRIAS DE JULHO

segunda-feira, 25 de junho de 2012
DAS PÁLPEBRAS DE BODHIDHARMA

segunda-feira, 18 de junho de 2012
O OVO POCHÊ & A FAROFA

segunda-feira, 4 de junho de 2012
"MELHOR DO QUE ARDER"

AGRADECIMENTO É FERMENTO

segunda-feira, 28 de maio de 2012
E VIVA A TIREOIDE!

segunda-feira, 21 de maio de 2012
COMIDA PREVISÍVEL

terça-feira, 15 de maio de 2012
HOJE TEMOS...

terça-feira, 8 de maio de 2012
NA COZINHA DA CASA DO PARQUE

sexta-feira, 27 de abril de 2012
AFAGO

segunda-feira, 23 de abril de 2012
ADEUS AOS ESCARGOTS

Assinar:
Postagens (Atom)