quinta-feira, 25 de junho de 2009

PREFERÊNCIA NACIONAL

Quando o Padre Anchieta chegou ao Brasil, um hábito dos índios, no mínimo curioso, lhe chamou a atenção em particular: em uma determinada época do ano, os nativos ficavam excitados para colher “os frutos que vinham do céu”. Enchiam gamelas deste alimento que, depois de torrado como se fazia com os amendoins, provocava um alvoroço em toda a tribo. Os tais frutos eram, na verdade, formigas de abdômen avantajado (e não bumbum como se imagina; mas deixemos esse pequeno detalhe para trás), conhecidas como tanajuras ou içás que em tempos mais quentes, quando está prestes a chover, costumam sair de suas tocas, em busca de brisa fresca e mais conforto nos galhos das árvores. É aí que as coitadinhas se dão mal... As “bundudinhas” não resistem ao sacolejo provocado pelos fortes ventos de outubro e caem aos montes. E a cantoria ecoa (pelo menos naquela época) para uma farta colheita: “cai, cai tanajura, tua mãe tá na gordura”; e como se não bastasse: “tanajura cai, cai, pela vida do teu pai”. Triste sina a desta formiguinha alada, do sexo feminino, que depois de acasalar fundaria um novo formigueiro, se sua cobiçada protuberância, a tão desejada bolinha traseira não tivesse se tornado uma iguaria brasileira. O abdômen do bicho é então separado do encéfalo, comido cru pelos mais atrevidos... De paladar muito agradável, lembrando o gosto adocicado de uma uva passa, dizem alguns, ou o sabor marcante de um camarãozinho fresco, segundo muitos, esse alimento nutritivo, rico em proteínas, potássio, ferro e cálcio, pode ser consumido frito, como aperitivo, mas é a farofinha de tanajura que enche os olhos e dá água na boca. Ela virou mesmo, preferência nacional!Se você for curioso e ousado o bastante para degustar essa especialidade cabocla, não se intimide, pois é sabido que, quem não arrisca, não petisca e você pode não ter uma segunda chance! E saiba: é lá pelas bandas (eu disse bandas!) do Ceará que você vai encontrar as melhores e as mais saborosas, digamos, bundinhas, o trunfo e, ao mesmo tempo, o fardo destas pequeninas guerreiras do nordeste brasileiro.
Voltemos à nossa farofa... Em uma frigideira, derreta duas colheres de sopa de manteiga, doure uma cebola pequena picadinha e um dente de alho também picado. Junte meia xícara de chá de “bundinhas de tanajura”, frite-as ligeiramente e em seguida, acrescente uma xícara de chá de farinha de mandioca peneirada. Acerte o sal. Salpique salsinha picada a gosto. Decore com algumas apetitosas pimentas frescas (a dedo-de-moça dá cor e vida ao prato) e sirva como acompanhamento, de carnes, por exemplo.Minha sugestão: na hora de propor o prato, lance mão do seu sorriso mais faceiro e pergunte: Vai uma bundinha aí? Bon appétit!

“Algumas vezes é obrigada pelas circunstâncias, dá pedaços de si para que sua colônia prospere. Ela produz certos tipos de ovos que são, talvez, sacrificados em favor daqueles outros primeiros postos. É assim a vida de muitas mulheres que encontrei pelas estradas do nordeste. Verdadeiras tanajuras, evidente que não estou tecendo nenhum elogio ou comentários à bunda delas, mas à entrega que fazem a sua família, a sua colônia, bem como à criação e manutenção da família.” (desconheço o autor)

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